terça-feira, 11 de outubro de 2011

O drama de uma tradição: a submissão das mulheres chinesas



         A tradição surge a partir de costumes comuns e casuais de todas as sociedades, no entanto como estas se tornam populares em determinada região ou espaço? E qual a razão de sua cultura tornar possível a adesão das camadas sociais de um povo? São questionamentos implícitos para costumes, que deflagram culturas ricas em costumes próprios de difícil compatibilidade com outros povos, a diferença será o marco da expansão em uma determinada região. Tomando como foco a China, observamos como a tradição será fundamental, para criar a sociedade chinesa dos dias atuais, a vivência milenar em regimes autocráticos faz com que os chineses não se rebelem contra o regime implantado, já que estes nunca possuíram um regime democrático ao longo de sua história. Assim, a submissão às tradições, é evocada pelo governo, para melhor controle das massas. Isso não quer dizer, que intelectuais e partes da massa chinesa concorde com o regime opressor, mas se omitem com medo das repressões que este propagar. Um fato a ser destacado nesse texto se relaciona ao passado da China, que trata das mulheres, no que diz respeito às práticas, nas quais as mulheres se acostumaram a praticar, em busca de padrões de beleza e obediência ao sistema familiar. Um costume que submetia a mulher a dores extremas e tornava esta, inútil para trabalhos domésticos e no campo, tendo em vista que essas eram fundamentais para a economia familiar. Mesmo assim, as famílias submeteram estas por um único motivo, tornar essas mais submissas, tirando toda capacidade física e tornando essas mulheres psicologicamente afetadas. A normalidade encarada por essas, tornava o enfaixe dos pés, uma dor referente à dor do parto, só que estas se enganavam, a dor do parto era passageira, mas esta era constante e não permitia que as mesmas tivessem uma vida comum.
             O historiador Americano John King Fairbank em sua obra “China uma nova história” vai descrever sobre esse costume no qual este ainda presenciou na década de 1930, quando o mesmo morou com sua mulher na China. Esta prática é descrita por Fairbank como horrorosa diante das mulheres que este avistou já no inicio do século XX, com pés enfaixados. A locomoção dessas mulheres era lenta e desengonçada, em seus rostos o sofrimento por estar em pé, com pés minimamente pequenos.  Fairbank vai dizer em seu texto que essa prática de enfaixar os pés, foi muito disseminada no século XIX, mas sua origem remete a corte chinesa do século XII, da dinastia Song, mas com o passar do tempo se tornou comum o enfaixe dos pés nas classes mais baixas da sociedade chinesa, principalmente na camponesa, que vivia da agricultura. Como já falado no início do texto, as mulheres possuíam uma grande responsabilidade nas plantações, mas estas perderam a capacidade física a partir deste costume, tudo isso para adentrar aos padrões de belezas que dariam bons casamentos para estas e ajudariam as suas famílias com dotes que atingiriam um percentual referente ao tamanho dos pés que estas mulheres possuíam. O fetiche sexual criado pelos homens diante dos pés pequenos influenciou essa prática cruel. Poemas eram feitos em referência aos pés das mulheres, a beleza enfatizada pelas mulheres escondia o desejo sexual masculino, que submetia desde menina ao enfaixe dos pés, meninas de cinco a seis anos iniciavam ao processo, muitas não resistiram aos procedimentos de enfaixamento dos pés, a mortalidade foi grande, a dor implacável que se sucedia para que os pés não crescessem, continuava na vida adulta. Muitas não tiravam o enfaixe, e permaneciam até sua morte, mesmo assim essas infligiam suas filhas a fazerem os mesmos procedimentos. Nem sempre o enfaixe impedia o crescimento dos pés, dessa forma, em uma atitude desesperada muitas se mutilavam, cortando metade dos pés, tudo isso para ficarem nos padrões femininos da tradição chinesa.
              O enraizamento desta cultura se tornou tão comum, que mesmo passando por dores implacáveis, as mulheres que se submetiam a este processo de enfaixe dos pés ridicularizavam as mulheres que possuíam pés normais. A adesão dessa prática não atingiu as minorias chinesas, esse é o caso dos manchus, dos mongóis e convertidos ao cristianismo. Inclusive no período mais disseminado do enfaixe dos pés, que fora no século XIX a dinastia que comandava a vida dos chineses, era de origem manchu, os Qing. Os imperadores contestavam essa prática, já que sua etnia não era adepta. No entanto estes não eram chineses, e para governar um povo que grande maioria seguia um costume, estes tiveram que se adaptar, para se manter no poder, e evitar uma rebelião de uma massa de tradicionais chineses, que se sentiam infligido, pelo poder está nas mãos de um povo que possuía minoria em território chinês. Dessa forma os imperadores Qing, não tinham voz para contestar essa atividade, que tornava a mulher um flagelo. Princípios Confucianos também discordavam dessa prática cruel. Fairbank se pergunta será que as mulheres acreditavam na teoria masculina de que o enfaixe dos pés produzia músculos que aumentavam o prazer dos homens na copulação? O que essas mulheres poderiam mesmo sentir, a não ser inferioridade, medo de romper as tradições e a autoridade familiar, estas viviam aprisionadas pelo um regime tradicional, que não as permitia fugir de suas obrigações, a incorporação desses sentimentos criavam a personalidade deturpada da mulher chinesa dos pés enfaixados, que depois submetia suas próprias filhas a este costume, por considerar uma convenção que não podia ser rompida, assim a mãe ensinava a filha a ser submissa. Uma prática que nos dias atuais, não existe preocupação dos historiadores e sociólogos chineses de estudarem esse acontecimento, pelo fato de que homens e mulheres chineses ainda possuem dificuldade de assumir a existência desta atividade, uma tentativa de obscurecer algo que outrora fora comum, e hoje entre algumas famílias camponesas chinesas deve ter permanecido essa prática horrenda, que machuca e agride, e cria pessoas com distúrbios psicológicos. 

Ronyone de Araújo Jeronimo